27 outubro 2005

Pouca soja roupa suja

Cadu Corrêa

Pouca soja
roupa suja
morte lenta
vem me ver

Morro agora
muito sanque
pouca água
pra beber

Abre a boca
feche a casa
abra os olhos
mira o cais

Mão fechada
peito aberto
carne fraca
descanse em paz

Perco o norte
acho a sorte
dando ibope
pro azar

Salva o dia
uma menina
de vestido
me beijar

26 outubro 2005

Costurando

Julia, linha e agulha
Cadu Corrêa

Julia! Vamos, Julia!
O pano a gente costura
Usando só linha e agulha.

E o mundo, Julia?
Como a gente costura?

Vamos, Julia...
Eu sei que você sabe.

Pegue um papel
Escreva algumas linhas
(a caneta é a agulha).

Ande, Julia, não pense.
Às favas com o juízo.
Remende poesia onde achar preciso!

Koratzaoo
Julia Nemirovsky

Eu pego a caneta
para costurar a vida
tão desconexa e embaralhada

Mas antes saio à cata de retalhos
(uma colcha macia viria a calhar)

Em uma esquina insossa
encontro um amigo
que sorridente e sereno
me estende os braços

No abraço apertado começo a tarefa
cozendo bem perto nossos corações

25 outubro 2005

Quadra II

Cadu Corrêa

Cada palavra que escapa de nós
Já não mais pertence à boca que diz
Nem mesmo o beijo, que cala a voz
Sabe das frases que um dia eu fiz.

24 outubro 2005

Quadra I

Cadu Corrêa

Prenúncio de que morre um coração:
Antes de rachar geralmente estala
E se pode saber na medida que regala
Onde foi que o amor errou na mão.

21 outubro 2005

Uma menina de saia

Cadu Corrêa

Uma menina de saia
discman e chiclete
estoura uma bola
passa sem me ver

Meu coração fica
a olhar o riso
mas eu não rio
e nada digo

Me despeço
apenas com o olhar
e já sinto saudade
dela pequena

Ela passou
tantas passaram
meu deus, quantas
ainda passarão?

Uma voz dentro grita: agarra
senhoras com sacolas resmungam:
velho sem vergonha

Eu,
simplesmente observo
nem sei mais se desejo
observo somente

Observo
e me deixo doer

20 outubro 2005

Coração passa

Cadu Corrêa

Jovens vejam
como é triste e grande
a dor de uma espera infinita

Por amor:
passam anos vidas passam
e o coração bem amado

Não passou.
o peito contempla apenas
pernas novas. na calçada

Velha saudade
(dos velhos tempos de calçadas novas
e jardins) que hoje doi tanto.

Tanto amor
o velho tinha e não amou, morreu!
nem pneumotórax nem tango argentino.